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30 de abril de 2013

Desmontando Falácias (ou "Pela maioridade nos argumentos")


Recebi um email repassando “argumentos do prof. Adilson Dallari” a favor da redução da maioridade penal. Infelizmente (mas não surpreendentemente), o autor do email não revela os emails dos demais destinatários, impedindo assim que se abra um debate real. Por esta razão, tomo a liberdade de trazer a discussão para este blog:
Quem perde e quem ganha com a redução da idade mínima de responsabilidade penal?

 
1) Primeiro argumento falho do prof. Dallari:
“A Constituição Brasileira (...) reconheceu expressamente que aos 16 anos o menor tem plena capacidade de discernimento, a ponto de poder eleger todos os mandatários políticos (...) Logicamente, em termos de lógica formal, algo não pode SER e NÃO SER ao mesmo tempo. Assim, ou bem se tira a capacidade eleitoral ou se confere a responsabilidade penal.”

Resposta:
- Em primeiro lugar, o sr. coloca em pé de igualdade duas questões diferentes (e independentes): maioridade penal e voto facultativo para cargos eletivos. Vejamos apenas alguns aspectos cabais dessa diferença, demonstrando a clara ASSIMETRIA da lei no que se refere à maioridade:

a) Maiores de 18 anos são OBRIGADOS a votar, enquanto os menores (a partir dos 16 anos) têm o direito de ESCOLHER se querem ou não votar;
b) Mais grave que isso: menores PODEM eleger todos os mandatários políticos, porém NÃO PODEM ser eleitos para nenhum desses cargos!

Só isso já é o suficiente para se pensar, não é? Porém, como físico, preciso também me contrapor ao uso da lógica formal aqui. De fato, a lógica formal jamais poderá ser utilizada como critério da verdade, uma vez que é possível chegar a conclusões absurdas utilizando lógica formal. Tudo depende dos pontos de partida, sobre os quais muitas vezes não há concordância alguma. Em alguns casos há mesmo uma concordância quanto à FALTA de validade das premissas iniciais, porém a lógica formal é insensível à mentira e permite concluir que “as baleias voam”, só para citar um exemplo pescado rapidamente na internet. Em resumo: lei alguma, decisão alguma deve ser baseada simplesmente na (muita vezes falsa e errônea) lógica formal.


2) Segundo argumento falho do prof. Dallari:
“A capacidade política aos jovens de 16 anos foi um golpe do PT, pois o jovem tende a ser generoso, se preocupa com a desigualdade e acaba acreditando nas maravilhas do socialismo. Só com o amadurecimento e a experiência ele vai perceber o engano, mas até aí já votou várias vezes no PT.”

Resposta:

a) EPA! Aqui o sr. está francamente NEGANDO ao jovem sequer a possibilidade de ter “amadurecimento e experiência” suficientes para votar “bem”, na sua opinião? Lamento informar que o sr. acaba de se contradizer em relação ao ponto principal da discussão colocada pelo sr. mesmo no item anterior. Brincando, eu poderia até dizer que “encerramos o jogo aqui”. Mas há muito a se dizer, ainda;

b) O sr. acha mesmo que “generosidade” e “preocupação com desigualdade” são ENGANOS? Só posso lamentar pelo sr.;

c) O sr. acha mesmo que os jovens de 16 anos são “petistas por natureza”? Conheço um bocado de gente da juventude tucana que vai ficar brava com o sr. por isto. Conheço também a juventude anarquista de minha cidade, com a qual me identifico, e que deve estar rindo do sr. nesse exato momento;

d) O sr. realmente acredita que o PT, como um todo, ainda é francamente socialista? Parabéns, o sr. crê mais no PT do que uma parte dos eleitores do partido, que se move por questões mais imediatas e concretas do que “ser ou não ser socialista”.

e) O sr. sustenta que só os imaturos e inexperientes votam no PT? “Depois percebem o engano...” – Lamento, sr., mas minha mãe e a maior parte dos docentes universitários com os quais convivo diariamente desmentem sua afirmação. Não estou julgando partido algum aqui, apenas mostrando a falha do seu argumento.

 
3) Terceiro argumento falho do prof. Dallari:
 
“Quem não foi socialista na juventude, não tem coração; quem permanece socialista na maturidade, não tem cérebro.”

Resposta:

Como diria Itamar (o compositor, não o ex-presidente), “Chavão abre porta grande...” – com a triste reprodução deste chavão aqui, o sr. diz, de uma só vez:

a) que a juventude de direita não tem coração;

b) que socialistas experientes não têm cérebro;

c) pior de tudo: que anarquistas não tem nem cérebro nem coração.

Puxa, o sr. não deve ter coração para falar desse jeito...

 
4) Quarto argumento falho do prof. Dallari, acompanhado de um acerto (que bom!):
“Alguém duvida que os jovens delinquentes, revoltados, que se consideram vítimas da sociedade e que não respeitam os valores burgueses (como vida e propriedade) são potenciais eleitores do PT? (...)
“Tudo bem: eu até concordo que o mais importante seria desenvolver MUITO a educação, mas uma coisa não impede a outra. Educação e responsabilidade não são incompatíveis: ao contrário: são complementares.”

Resposta:

Juntei o quarto item com o primeiro acerto para não ter que dizer “vamos para o quarto”, uma vez que não pretendo correr o risco de ser mal interpretado (eu até dividiria com o sr. uma mesa de bar, mas nunca um quarto).
Creio que o sr. comete um erro grave ao afirmar que a VIDA é um “valor burguês”. Não, prezado sr., a VIDA é o mais alto valor humano, independentemente de corrente política ou partidária. Talvez isso até o surpreenda, mas essa verdade vale para os pobres, os burgueses e os ricos aos quais os burgueses servem.
Finalmente, sobre educação e responsabilidade serem complementares: CONCORDO! Acho inclusive que são uma única e mesma coisa. Como exigir responsabilidade de uma criança de 2 anos, por exemplo, se lhe falta educação? Ainda quanto à responsabilidade, sugiro ao sr. o estudo da prática da “justiça restaurativa” – essa, sim, é uma prática que educa, dando responsabilidade. Bem melhor que esquecer os maiores e menores problemas numa cela e esperar que ocorra um milagre.

Atenciosamente,
Paulo Barja