27 de dezembro de 2018

BANHADO ORGÂNICO

A comunidade tem mais de oitenta anos de existência e mora em local curioso: é uma roça bem ao lado da região central da cidade. A mídia diz que há traficantes entre os moradores. O prefeito pede na justiça a saída imediata da comunidade – pretende fazer no local uma via expressa (apenas para carros) e um parque. Mas o próprio bairro já é um parque, com a vantagem da produção da agricultura familiar. A comunidade produz as melhores bananas da cidade.
Encontro pai e filho na rua, empurrando um carrinho onde vendem sua produção, quase em frente a um supermercado:
- É banana orgânica! Não tem aquele monte de produtos químicos, não.
Peço meia dúzia. O menino aponta para umas poucas bananas no canto do tabuleiro e pergunta:
- Pai, essas aqui estão meio verdes, feinhas. Vende?
- Com essas a gente faz doce, filho.
Pergunto se as bananas são do bairro ameaçado pela prefeitura. Eles confirmam:
- Sim, moramos lá.
Pelo sabor da solidariedade, acabo comprando uma dúzia.

13 de dezembro de 2018

“PARAHYBA RIO MULHER”: UMA FORÇA NECESSÁRIA


Lirismo e força: performance traz para a rua a "História além dos livros"

     “Vivemos tempos difíceis” é quase o novo “Bom dia” dos brasileiros, neste 2018 que é um agravamento de 2017, que foi, por sua vez, uma sequência dura de 2016... Mas cabe uma pergunta: desde quando estamos sendo golpeados? Não aprendemos isso na escola, mas a verdade é que a História do Brasil tem sido, desde sempre, a história de uma sequência de golpes. Ou alguém ainda acredita no mito de que os portugueses eram brancos civilizadíssimos que chegaram aqui tratando muito bem os índios, que foram auxiliados em trabalhos voluntários por negros bem dispostos vindos da África Mãe?

     Ainda hoje, a chibata é vista como recurso para uns - mas é pura dor para outros. Nesse contexto, e voltando a 2018, o mergulho (cultural, artístico) em episódios tristes da nossa história é importante para revelar caminhos de resistência. Porque, se temos uma longa história de golpes, também é verdade que temos uma longa história de resistência. Perguntem aos índios, por exemplo. Ou às mulheres fortes da Paraíba!

     Não acredito em acaso: todo encontro tem uma razão de ser. No meio da semana, no meio de tarde, no centro de São José dos Campos, eu e minha filha ficamos sabendo que haveria teatro de rua na Praça do Sapo. Como só a Arte salva (e à noite ainda haveria trabalho), resolvemos ir até a praça.

      Chegamos cedo: “Elas estão no calçadão!”

     Fomos ao encontro das moças. Percussão, voz e energia davam o toque: “tá com cara de que vai ser bom”, pensei. Foi mais: foi necessário. Sempre cantando, a trupe chega à praça, onde a própria demarcação de espaço marca o início da performance. O vermelho está presente: enquanto denunciam episódios de violência contra a mulher, as moças banham-se num rio que é de água e de sangue. E então começa uma aula ao mesmo tempo de Arte e de História – aquela que os livros não contam, ou seja, aquela que vai bem além das verdades oficiais.

     Anayde Beiriz foi uma escritora e poeta libertária, destinada a chocar a conservadora sociedade paraibana da primeira metade do século XX. Defensora ardorosa da participação feminina na política e nas artes, Anayde envolve-se amorosamente com João Dantas, líder da oposição ao então “presidente da Paraíba” (governador) João Pessoa. Em meio a um violento confronto político, Dantas se refugia no Recife, sem abandonar Anayde: o amor revolucionário é cantado em cartas, em verso e prosa. João Pessoa então manda a polícia revistar as casas dos revoltosos, buscando armas que comprovassem a preparação de uma revolta armada. Em vez de armas, a polícia encontra cartas e poemas de amor no cofre do escritório de João Dantas, na capital da Paraíba.

     Amor é crime? O material epistolar apreendido é fartamente divulgado por jornais alinhados ao governo, para atingir Dantas, que reage “na lata”: numa confeitaria recifense, mata João Pessoa com um tiro à queima roupa, sendo preso em flagrante. Anayde então vai morar num abrigo no Recife, onde visita Dantas até que este é encontrado morto em sua cela. A desculpa oficial é a de sempre: suicídio. Poucos dias depois, Anayde morre envenenada, em mais um “suicídio” assim, entre aspas.

     A violência pode assumir muitas formas.

     A força de Anayde me faz lembrar da santista Pagu, que viveu na mesma época. E em outras mulheres guerreiras, de todas as épocas. As atrizes falam de suas avós e convidam o público a falar também, para que se honre – coletivamente – a memória destas mulheres. Há espaço para lirismo e saudade. As falas finais do espetáculo retomam o caráter de resistência política ao defender publicamente a coragem de Dilma Rousseff, vítima de um processo de impeachment claramente carregado de machismo. Enquanto escrevo esse texto, multiplicam-se denúncias contra um certo eleito e seus filhos, envolvidos em atividades “pouco republicanas”. Como agirá a imprensa agora?

     A história brilhantemente contada por Cely Farias, Kassandra Brandão, Natália Sá e Jinarla Pereira fala da Paraíba, do Brasil e, em última análise, de todos nós. O grupo tem a melhor das qualidades quando se trata de teatro, principalmente na rua: as moças mostram um entrosamento perfeito. O espírito de equipe valoriza cada momento do espetáculo, visualmente belo, fortalecendo um trabalho que já é forte pelo tema abordado.

     Toda força a essas moças! Que façam mais e mais arte pelas ruas de nosso país, que anda precisando. E que a História – essa que mora além das verdades oficiais – seja sempre lembrada, para possamos resistir sempre às tentativas de silenciamento.

P.R.Barja

2 de novembro de 2018

INSÔNIA


Quem me faz perder o sono
Não são os meus inimigos.
São os meus amigos.

Passo a noite insone
Preocupado, atônito
Pelos meus amigos.

Saio pelas ruas
Buscando esperança
Para meus amigos.

Madrugada. Frio.
Na esquina, o fuzil.
Cadê meus amigos?

Recuso-me a ir
Para outro país
Sem os meus amigos.

Minha casa é bunker,
Trincheira, aparelho
Para os meus amigos.

Jamais tranco a porta.
Pode ser que cheguem
À noite, os amigos.

Faremos silêncio
Nesse tempo tenso
De poucos amigos.

O café amargo.
O abraço largo.
Abraço de amigos.

O lirismo existe
E sei que resiste
Pelos meus amigos.

Ao Deus que nos vê
Peço apenas isso:
Ampare-os. Proteja-os.

Se eu for preso, faça
Com que esqueça o nome
Desses meus amigos.

Eu nada direi.
Que meu sangue aqueça
O dos meus amigos.

Leiam Brecht por mim
E ouçam muito Chico,
Queridos amigos.

Pratiquem Boal,
exercitem Freire,
Orgulhem-me, amigos.

Canções de protesto
Mas de Amor também.
Viva meus amigos!

O amanhã virá.
Que os encontre bem.
São os meus amigos.

(Paulo Roxo Barja)

26 de outubro de 2018

Também a Academia Luta Por Democracia


Não vim da periferia
mas prezo a democracia,
por isso quero rimar
Liberdade e Igualdade,
mas também Diversidade
- isso é que vai nos salvar.

Mas não é só isso, claro:
há um sentimento caro
que nunca pode morrer.
Falo da Fraternidade,
que nos forma a Identidade
e a todos nós dá poder.

É nas festas da quebrada
que se organiza a moçada
e devemos respeitar.
Essa força não se acaba:
chega de Piracicaba
e aqui também tem lugar.

Economia criativa
mantém a galera ativa,
movimenta e empodera;
a moeda social
pra nós pode ser jornal
palestra e fala sincera.

Isso é patrimônio sim!
Nosso estudo não tem fim,
deve ser transformador
e gerar questionamento,
pro nosso enriquecimento.
Digo isso com amor.

Cada slam, cada sarau
é resistência vital
que vamos fortalecer,
pois também a Academia
luta por Democracia
- esse é o nosso dever.



23 de outubro de 2018

Artigo sobre os Cordéis Joseenses, ciência e cidadania

Acaba de ser publicado novo artigo, em parceria com a profa. Claudia Lemes, sobre a relação entre a produção cordelística, a ciência e a cidadania. O trabalho é fruto de nossa participação em evento realizado na UNICAMP e, para ler o texto na íntegra, basta acessar o link abaixo: 

Cordéis Joseenses - da Ciência à Resistência Cidadã

1 de outubro de 2018

III Seminário de Estética Social (IP - USP, 2018) - dois trabalhos apresentados

No final de setembro/2018, eu e Claudia Regina Lemes participamos do III Seminário de Estética Social, no Instituto de Psicologia da USP. Essa terceira edição do evento foi muito estimulante e gratificante para nós. A seguir, disponibilizamos os links para os 2 trabalhos que apresentamos no evento:

(DOI: 10.13140/RG.2.2.23160.49920)


(DOI: 10.13140/RG.2.2.23789.64485)

27 de agosto de 2018

A TV e o recorte da realidade (apenas mais um exemplo)

     Almoço num restaurante self service do centro da cidade. Como em quase todo estabelecimento do tipo, há uma TV que fica ligada e, na hora do almoço, transmite um noticiário local.
     Num certo momento do noticiário, surge o velho truque: a tradicional matéria emotiva sobre uma pessoa da comunidade (normalmente criança ou idoso) que conseguiu uma vitória pessoal, uma conquista importante. Nem é preciso ver toda a reportagem para entender a motivação: manter motivados, dóceis e "operantes" os oprimidos (que veem o jornal nos self services do centro da cidade).
     Na matéria de hoje, conta-se a história do "seu Durval", que se aposentou pela EMBRAER e virou, vejam que lindo, um artista: pinta quadros sobre a natureza, com flores e pássaros sempre bem coloridos. "Seu Durval" explica que somente depois da aposentadoria conseguiu se dedicar a esta sua paixão, e agora faz exposições de suas obras em cidades da região.
     Os quadros são bem bonitos. O tom da matéria é de felicidade serena.

     Mas...

     O que o jornal teria a obrigação de mostrar (e que, no entanto, ficou bem escondido):
     i) Com a Reforma da Previdência (que o governo insiste em impor e a mídia é bem paga para apoiar), não haverá mais aposentados podendo dedicar-se à pintura, pois as pessoas agora terão que "trabalhar até morrer" (literalmente, na maioria dos casos);
     ii) Com a privatização da companhia em questão, muito em breve não haverá nem mesmo novos "Durvais" trabalhando, pois tudo sinaliza para a internacionalização da produção, com desemprego em massa de brasileiros.

     Essas coisas não são ditas, pois turvariam a tela, estragando a felicidade serena imposta pela TV.

Paulo Barja

31 de julho de 2018

Falta consistência nas perguntas

(ou "a mídia não ajuda")

     Consistência não dá manchete. O que ferra é que esses agentes midiáticos (em programas como o Roda Viva) buscam tipos de inconsistência diferentes em diferentes candidatos, revelando aí sua ideologia:
     1) Pro Alckmin é tipo "mas vai ter dinheiro pra isso?";
     2) pro Bolsonaro, "mas e se você brigar com seu assessor econômico, como fica?";
     3) pra Manuela, é "como você vai explicar pra sua filha que você defende comunista comedor de criancinha?" - para piorar, interrompem as tentativas de resposta, investindo na confusão, em vez de trabalhar por esclarecimento.
     Mais capcioso, impossível.
P.R.Barja

28 de maio de 2018

Domingo de Cidadania

(Apesar de tudo...)

   Neste domingo, ao meio dia, fui à comunidade Santa Cruz para um evento de futebol - organizado pelos próprios moradores. No caminho, passei pela maior praça da região central da cidade, onde cerca de 15 pessoas vestidas de amarelo tinham esticado uma faixa pedindo intervenção militar. Alguns apitavam. Nenhum discurso.
   Não desviei meu trajeto. Seguindo no rumo do evento comunitário, cheguei à Santa Cruz. Alto astral: os meninos recebiam as camisas dos times - cinco times, cinco cores. Vestindo a camisa da seleção espanhola, fui logo chamado de "olheiro da Espanha". Brincando, disse aos meninos que tempos atrás já havia levado "um certo Neymar" embora pra Europa. Todos sorriram. Debatemos rapidamente lances da partida da véspera, Real Madri x Liverpool. Que golaço, o segundo! E que falhas do goleiro, os outros gols... Em minutos, éramos amigos.


Os times, uniformizados
Escolas participaram

Pose para foto oficial

Artistas e apoiadores, ao lado da mesa das premiações

   Em paralelo ao futebol, iniciava-se a organização para o almoço comunitário. Tudo colaborativo, todos se ajudando e se fortalecendo. Deixei kits de cordéis para a premiação dos meninos e, junto com amigos, também alguns livros.
   Na véspera, havia ocorrido um incêndio por lá, na casa da mãe de um líder comunitário, mas todos se uniram, ajudaram (procedimentos emergenciais efetuados, estragos avaliados, planos para reconstrução) e resolveram manter o evento. Atrasou um pouco. Alguns tinham ido à comunidade de Pinheirinho dos Palmares para o lançamento da candidatura de Lula à presidência.
   No evento, conheci um jovem escritor da comunidade, que lançava seu primeiro livro. O relato autobiográfico contava os muitos apuros de alguém que ainda tinha tanto a viver e que encontrara no rap uma forma de falar sobre e para a comunidade. Enquanto conversávamos, reparei que o som ambiente apresentava raps feitos provavelmente por ele e colegas dali. No início de cada gravação, trechos de notícias de rádios locais falavam sobre supostos crimes ocorridos no interior da comunidade. Entendi na hora a denúncia. Daquele jeito, os artistas locais mostravam a todos a forma como eram vistos pela cidade - e que destoava completamente da realidade que eu conheci ali, ao vivo.

Conversa de cantadores boleiros - de vermelho, fui por alguns minutos o "olheiro da Espanha", rs

Hora dos jogos!

Torcida presente, acompanhando e comentando
Premiação literária: cordéis e livros
A comunidade, em torno do futebol: um universo riquíssimo: quadra e parquinho comunitário, arte visual, literatura...

   Com os jogos ainda acontecendo, passeamos pelas ruas estreitas e visualmente riquíssimas da comunidade. Símbolos de futebol aqui e ali, comércio alternativo, paz e limpeza. Fomos almoçar na padaria e depois nos despedimos dos colegas.

A grande vitória é participar
   Na volta, às 14h45, sempre a pé, passando novamente pela praça na região central da cidade... Vimos agora cerca de 150 pessoas, a maioria usando roupa amarela e alguns "embrulhados" em bandeiras do Brasil. Uma viatura da polícia circulava dando segurança a eles. Havia megafone, mas o único e insistente discurso era:

"Liguem para qualquer rádio! Avisem que estamos aqui.
Serve qualquer rádio. Tentem a Jovem Pan..."

   Não pude deixar de pensar no tanto que aqueles "brasileiros de bem", uniformizados, teriam aprendido sobre cidadania se tivessem visitado a comunidade Santa Cruz.

* * *

   Poderia ter acabado por ali, mas, em seguida...
   Quase na esquina de casa, um rapaz negro, forte, pedia "pelo amor de Deus" que alguém ajudasse a comprar fralda para os filhos (gêmeos) dele... Disse que havia saído da cadeia há quatro dias (após 8 anos de reclusão por homicídio) e a polícia já tinha passado por ele há alguns minutos, fazendo marcação, perguntando o que ele estava fazendo ali... Ele estava tentando juntar dinheiro para as fraldas. Tinha menos de quatro reais, às 15h. A mulher estava sentada na calçada, a uma quadra, com os filhos, no frio, no sol... Ele confessou que conhecidos tinham falado para ele roubar fraldas, mas ele não queria se sujeitar a voltar para a cadeia depois de tudo... Paguei o pacote de fraldas. Com delicadeza, ele me pediu também a nota fiscal, para provar que as fraldas tinham sido compradas. Percebam a crueldade: a sociedade punitiva faz marcação cerrada... Aquele homem simples sabia que precisaria provar sua honestidade a cada instante, a cada gesto. Após guardar a nota, ele perguntou se eu era de alguma igreja; eu disse que não. Ele então me deu a bênção de Deus.
   E eu recebi.

(Paulo R. Barja, com Claudia R. Lemes e fotos de JB, Moacyr Pinto e P.R.Barja)

6 de abril de 2018

NÃO HÁ PRISÃO QUE NOS CALE


muitos falam de Jesus
- ele arrastou sua cruz.
os pregos vieram depois.
qual o crime cometido?

prenderam o nobre Gandhi:
não havia crime algum.
o tiro veio depois.
Mahatma vive em nós.

tentaram calar Mandela.
foi preso por tantos anos
que a luta se fortaleceu
- o apartheid foi acabando.

prenderam, sim, Luther King.
o tiro veio depois.
o rifle serviu apenas
para eternizar sua voz.

o governo americano
pediu a expulsão de Lennon.
o tiro veio depois.
mas quem canta? escute: é John...

há muita coisa que os une
além de morte e prisão:
justiça, amor, liberdade,
e a luta contra a opressão.

vivemos, neste momento,
tempos de grande injustiça.
saberemos revidar
com arte, mesmo sem rima.

"você pode até dizer
 que sou só um sonhador"
- eles sonharam também,
  buscando um mundo melhor.

medo? não. nunca. jamais!
os injustos é que t(r)emam
pois o amanhã nos acena.
a eternidade também.

(Paulo Roxo Barja)

1 de março de 2018

MÍDIA - PADRÕES DE MANIPULAÇÃO (3)

AULA RÁPIDA DE INTERPRETAÇÃO
DE NARRATIVA MIDIÁTICA PÓS-GOLPE
(a partir de apontamentos de Perseu Abramo)

Quando um jornalão afirma, em manchetes com letras garrafais, que 
"Recuperação chega a mais de 60% dos setores da indústria", está na verdade escondendo DUAS coisas:

1) A crise atual bateu forte em 38% dos setores industriais, que estão encolhendo.
Isso NÃO PODE (ou não deveria) ser motivo de comemoração, e sim de preocupação.

2) A tal "recuperação" não significa, no entanto, expansão nem contratação de funcionários (...). Durante a crise, a empresa [...] reduziu a equipe pela metade, para 40 pessoas.

Detalhe: este segundo trecho, eloquente, aparece isoladamente, "perdido" no meio da própria matéria do jornalão. Sim, aquela mesma que comemorava "recuperação".

Entenderam por que escrevemos entre aspas?

28 de fevereiro de 2018

Caro Demais

   Na triste manhã de sábado em que escrevo, um trabalhador está sendo velado em São José dos Campos; será sepultado à tarde. Foi assassinado durante o trabalho. Não falo de um empresário, industrial ou político; também não é diretor de empresa de ônibus nem Secretário de Transportes. Trata-se de um cobrador de ônibus, baleado durante um assalto na sexta-feira, 16 de fevereiro. Por conta disso, a paralisação dos cobradores e motoristas de ônibus no dia seguinte não é apenas justa: é necessária, para denunciar a absoluta fragilidade da vida de um cidadão trabalhador nesta cidade.

   Vejamos: São José dos Campos tem hoje uma das maiores tarifas de ônibus do Brasil (fica atrás de Brasília e Campinas). Mesmo assim, as empresas de ônibus solicitam aumento de quase 40% na tarifa – devem mirar o Livro dos Recordes. Surreal, já que nenhuma categoria de trabalhadores recebeu esse aumento – nem os secretários do prefeito, já contemplados com polpudos 19%. Pergunta-se: que segurança essas empresas – e, em última análise, a prefeitura – oferecem ao cidadão? A pontualidade é questionável; a disponibilidade de veículos em certas linhas beira o ridículo, com ônibus a cada hora e meia, provando que o sistema público de transporte visa o benefício apenas dos “de cima”, submetendo a população a duras condições de lotação – tentem espremer seis pessoas por metro quadrado, como as empresas aceitam nos ônibus.

   Atenta-se contra a vida a cada momento, aqui. Dizem que o barato sai caro. Aqui em São José, o caro é inaceitável.

Paulo R. Barja

27 de janeiro de 2018

MÍDIA - PADRÕES DE MANIPULAÇÃO (2)


PERSONALIZAR, QUANDO É PARA VALORIZAR;
ESCONDER, QUANDO É PARA EVITAR DESGASTE

Esse truque é manjado: personaliza-se a notícia para valorizar o sujeito (Carmen Lúcia) quando cumpre as medidas exigidas por essa mídia; no entanto, esconde-se o sujeito atrás de siglas quando se deseja preservar o mesmo de eventual desgaste com ação que mostre impunidade (ou qualquer outro gesto compreendido como "condenável pelo público")

3 de janeiro de 2018

MÍDIA - PADRÕES DE MANIPULAÇÃO (1)

Título de matéria publicada na primeira edição de 2018 do jornal "A Tribuna" (Santos, SP)



SE A AFIRMAÇÃO NÃO ENCONTRA RESPALDO NO PÚBLICO, A CULPA É DO LEITOR?

     A manchete do jornal santista sugere que a Economia melhorou, MAS as classes C e D não tiveram o bom senso de "perceber" ou "sentir" esta melhora. Ao longo do texto, arrisca-se até a hipótese criminosa: as pessoas estariam impressionadas por questões ligadas ao desemprego (e/ou subemprego) e isso estaria atrapalhando a compreensão do momento atual da economia.
     Ei! Desde quando se pode falar em melhora da economia com alta do desemprego? Para QUEM, afinal, a economia estaria melhorando, a não ser para os opressores de sempre? O erro não está na percepção das classes C e D, claro.