Mostrando postagens com marcador conto. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador conto. Mostrar todas as postagens

27 de janeiro de 2015

Microconto


Procurou, no canivete de 38 funções, uma que tirasse dor de amor. Acabou desistindo.
P.R.Barja

29 de agosto de 2014

whatsapp (conto curto)


     Ela andava triste, cabisbaixa, quando ouviu que a chamavam. Levantou o rosto e olhou para seu interlocutor, que perguntava:
   – Ei, o que houve? Por que está desse jeito? Sua beleza anda opaca...
   – Foi o resto da vida inteira que me fez assim. Agora, quase não durmo. Quando deito, ele vem me visitar...
   – Ele quem?
   – O demônio.
     Ela não teria dito isso se não tivesse percebido que o rapaz tinha asas.
   – Ah, que bobagem... Carpe Diem... aproveite o dia! O demônio tem medo de gente alegre.
    Ele abriu então as asas – eram imensas – e esticou a mão para ela. Voaram juntos. E dançaram, sorriram... foram felizes. Quando ele a deixou em casa (pela janela!), a moça emanava luz. Deitou-se e dormiu imediatamente.
     Naquela noite, quando o demônio se aproximou da cama, ela só abriu um olho e disse: BU!! E isso, esse simples “BU!!” impregnado de alegria brincalhona, assustou tanto o demônio que ele nunca mais voltou.

Paulo R. Barja

15 de janeiro de 2014

SEM MISTÉRIO (um causo de estatística escolar)


Era uma vez um professor de estatística que, ao final do ano, disse:
- Atendi 54 alunos na minha sala de aula, que tem 48 carteiras...
- ... nenhum aluno ficou em pé durante as aulas...
- ... e nunca pedimos carteiras emprestadas!!!

E aí, como se explica isso?

29 de novembro de 2013

Encontro com direito a manobrista


     Estava no meio do expediente quando ligaram do banco perguntando por ele. Assustou-se: disseram seu nome completo.
     "Sou eu...", respondeu, ressabiado. Mas não era pra tanto. A moça do outro lado da linha era só gentilezas. Moça? Sim, era moça com certeza, e pela voz devia ser linda. E fazia perguntas, firme e delicada ao mesmo tempo. Quando ele estaria livre para uma conversa? Hmm, que coisa mais inesperada, uma pergunta daquelas... aí resolveu entrar no jogo: "um minutinho, vou consultar a agenda..."
     Ele não tinha agenda há anos. A última se perdera no tempo e até na memória. Depois de um minuto: "tenho a quinta-feira, no período da manhã", respondeu novamente ressabiado, achando que a qualquer momento anunciariam o trote. 
     "Excelente! Que bom! Venha às dez horas, então", a moça firme e bonita parecia animada ao explicar como ele faria para chegar "lá". "O senhor não se preocupe: temos estacionamento com manobrista no local... estarei à sua espera!"
     Despediram-se cordialmente.
     Chegou a quinta-feira. Às nove, ele já estava na expectativa. "É só às dez", pensou. "Fica até chato chegar cedo. Melhor olhar as notícias antes..."
     Quando percebeu... já eram quase dez horas! Saiu esbaforido, camiseta e bermuda, sandália velha nos pés. "Tomara que a sandália aguente - e que a moça não repare."
     Dez horas. Faltando uma quadra para chegar, toca o telefone. "O senhor vem, não é? Não se esqueceu de mim..."
     Esquecer como? "Não, não, fique tranquila. Estou virando a esquina...!"
     Chegou. Dois seguranças - de terno! - o receberam. Cumprimentaram-no - pelo nome completo - e ele entrou. Constrangido, atrapalhou-se com as duas portas automáticas. Parou em frente à segunda porta, de vidro. Aliás, parecia que tudo ali era de vidro. Não tudo: do outro lado do vidro da porta, dois olhos azuis o encaravam. Gentis, pacientes: dois olhos - e um sorriso discreto.
     Ela era jovem. Linda. Amável: "Tudo certo? O senhor foi bem atendido pelo manobrista?"
     "Vim a pé..." (num quase sussurro envergonhado) "Caminhando..."
     E aí se encheu mesmo de vergonha: naquele espaço tão amplo e elegante, com várias salas de vidros esfumaçados, só ele era descuidado. Era ele o único elemento estranho no local.
     Mas ela era hábil e soube dissipar a tensão rapidamente. Apresentou-o a alguém da diretoria, ao gerente de investimentos - e ofereceu café. "Ou deseja alguma outra coisa?"
   "Café... café está ótimo."
     Pode parecer até estranho, colocando desta forma, mas foi um café inesquecível. Forte, encorpado - mas o principal nem era o café em si. Havia um ar quase reverencial na moça. Ela o serviu com elegância e graça. Esguia, parecia modelo de capa de revista. E aqueles olhos...
     "Vamos a um ambiente reservado, conversar um pouco", disse ela, e abriu de leve a porta de uma daquelas salas. "Epa! Desculpe" - e fechou a porta rapidamente. "Estão usando esta sala, vamos para o ambiente ao lado" - e foram.
     Enfim, a sós. E ela começou a fazer um monte de perguntas. Perguntou inclusive se ele estaria disponível para breves encontros semanais. Ele sentiu necessidade de esclarecer. "Sabe como é... além do serviço, eu tenho mulher e filho, então tem que ver direitinho essas coisas de horário..."
     "Ah! Então o senhor é casado?" - leve surpresa no tom de voz da moça. "Tudo bem, claro", e retomou o controle, novamente absoluta.
     E aí ela disse, em tom de confidência, consultando uma ficha: "Sabe, consta aqui que o senhor é um excelente investidor...! Sua renda mensal gira em torno de X, não?"
     "Ah... hmm... não... não, na verdade é muito menos que isso" - ele gaguejava. "Veja, eu sou professor..." - e na mesma hora voltou o incômodo: começou a achar a bermuda mais gasta; a sandália, mais velha...
     Tudo finalmente fazia sentido: desde o primeiro telefonema, era engano.
     Saiu de certo modo mais aliviado, sorrindo para os seguranças e o manobrista. "Coitados, trabalhando de terno num calor desses..."

P. R. Barja

24 de outubro de 2013

DEFESA DO LOBO


Eu sou mau? Mas não eu só:
investiguem a vovó
e as garruchas que escondia
ali debaixo da pia
e com as quais trucidou
minha família. Acabou
sendo salva por bandidos
que ali foram travestidos
de defensores da lei.
Sinceramente, não sei
porque é que eu respeitaria
leis humanas; se alguém chia,
posso explicar num segundo:
se a lei é pra todo mundo,
deve assim ser aplicada,
porém deve ser votada
por todo mundo também.
Quanto a mim, não sou ninguém:
nunca votei, afinal!
Se falam do "Lobo mau",
pergunto: é de mim que falam?

(Pensando... todos se calam.)

(P.R.Barja)

24 de agosto de 2013

TInha tudo, só não sabia ouvir


   Era jovem e bonito. Nada lhe faltava. Nada, a não ser uma certa paciência. Gostava demais de falar, mas tinha extrema dificuldade pra ouvir. E, quando ouvia, pela primeira metade da frase já tirava conclusões precipitadas: 
- Ei, sabia que a sua mãe... 
- PODE parar, ninguém fala mal da minha mãe, babaca!
- ... é uma pessoa maravilhosa? Me deu o melhor conselho que eu podia ter ouvido essa semana...
   Mas aquele-que-não-escutava saía, mesmo assim, pisando duro, jurando que o outro tinha sido ofensivo.
   Levava a vida assim. A maioria das pessoas nem percebia isso: muitos ficavam encantados mesmo com aquela pessoa especial e, com o tempo, suspiros acumulavam-se ao seu redor - esses eram prontamente ouvidos... quem explica?
   Um dia caiu num poço. Acidente: um buraco enorme numa rua, reformas em execução paralisadas pela época das chuvas, sinalização péssima. Caiu.
   Não conseguia sair. Mas tinha boa saúde e teve todas as condições de gritar por socorro. Foi o que fez. Havia pouco movimento por ali, mas em alguns minutos apareceram pessoas dispostas a ajudar:
- Calma! Vamos buscar ajuda!
   Ele até viu as pessoas lá no alto. Só não pôde ouvir, preocupado que estava em continuar gritando: 
- Tem água aqui! Vou acabar morrendo! Ajudaí, SOCORRO!
   Os bombeiros chegaram rápido e um deles iniciou o salvamento:
- Amigo! NÃO tente nadar aí embaixo, ok? Vamos jogar uma corda, apenas agarre firme...!
- Por que não me tiram daqui de uma vez? Tem muita água! Vou nadar pra ver se encontro uma saída!
- Amigo, NÃO faça isso! A corda está quase chegando...
   Morreu por não saber ouvir.
P.R.Barja

12 de junho de 2013

Microconto (para o Dia dos Namorados)


Começaram o jogo brigados, cada um numa ponta do sofá. O gol contra, no fim do primeiro tempo, parecia selar tudo. Mas veio o segundo tempo e a virada: 3 a 1. Noivado com data marcada.
P.R.Barja
 

23 de maio de 2013

A Ilha de Fliperamática (Isabel Barja)

   Era uma vez uma menina chamada Fliperamática. Ela vivia numa ilha. Nessa ilha tinha um mar enorme com vários peixinhos, e muitas gaivotas no céu. Nessa ilha não existia noite, só o dia, e sempre era verão, mas só tinha um problema: ela tinha muita saudade de sua terra, porque quando tinha nove anos, ela fugiu de lá e foi aonde o vento a levasse. Mas apesar disso ela gostava muito daquela ilha, pois era um lugar de alegria, paz e um lugar muito calmo também.
   Um dia, quando ela estava nadando na praia, ela viu um helicóptero e pensou: "ué, nessa ilha... é um lugar tão calmo, ela nem está no mapa!"
   E enquanto ela pensava o helicóptero pousou na ilha.
   E então uma pessoa disse:
   - Filha, é você mesmo?!!
   E então a menina ainda pensativa disse:
   - O QUÊ?
   E então a pessoa ainda feliz disse:
   - Filha, sou eu, o seu pai!!
   E então Fliperamática sorridente disse:
   - PAI!!!
   Quando Fliperamática descobriu que aquela pessoa era seu pai, eles voltaram juntos no helicóptero para casa e viveram felizes para sempre.
 
Isabel Barja (9 anos)

22 de dezembro de 2011

Microconto de violeiro (6)


   O violeiro tinha uns 40 anos de carreira, e ostentava a barba branca com aquele orgulho simples de quem sabe das coisas. Entrou no palco tranquilo para um show de fim de ano, mas inda não tinha nem tirado a viola do saco quando ouviu um moleque:
   - Papai Noel!

* Obs.: os "Microcontos de violeiro" estão sendo publicados no sítio VOA VIOLA
 

19 de dezembro de 2011

Microconto de violeiro (3)


– Eita, violinha boa! – dizia o seu Dito, sempre que via o João passar com a viola. E o João tocava na praça, em baile, em inauguração de loja, em comício, em festa junina...
Um dia o Sebastião perguntou: – Ô seu Dito, ocê fala tanto que a viola do João é boa, mas nunca vai nas festas em que ele toca, por que?
E o Dito, na lata: – Uai, é pruque o João não toca direito, não ponteia, é presepeiro mesmo... mas a viola dele... eita, violinha boa!

* Obs.: os "Microcontos de violeiro" estão sendo publicados no sítio VOA VIOLA

18 de dezembro de 2011

Microconto de violeiro (1)


   Fazia tudo por ela, vivia por ela. Aquela viola era a paixão do violeiro. Um dia, depois de uma cantoria, o carro desgovernado caiu no barranco. O corpo do violeiro foi encontrado agarrado à viola - que jazia intacta.
 
* Obs.: os "Microcontos de violeiro" estão sendo publicados no sítio VOA VIOLA

10 de novembro de 2011

Era uma vez...

... um governo principesco que se prolongava por mais de uma década, numa próspera cidade do Vale Encantado que, no entanto, tinha muitos problemas a resolver. Mas o governo achava melhor NÃO fazer nada, pois percebia que, com o apoio dos arautos da comunicação, continuava ganhando as eleições assim mesmo.
   O tempo passava (com aquela lerdeza típica dos contos de fada antes do surgimento do elemento de conflito)... 
   Um dia, a bela (cidade) adormecida começou a acordar... primeiro acordaram as partes mais novas, aquelas que ainda estavam em formação e, por isso mesmo, não tinham como estar acomodadas; aos poucos, os demais começaram a se espreguiçar...
   À medida que a bela adormecida acordava, o governo principesco começava a sentir uma coceirinha... e começou a aparecer também uma vermelhidão preocupante, em vários locais. Por fim, o governo principesco resolveu consultar o Grande Médico Estadual. Este destacou um Especialista em Medicina (E.M.), Manuel, pra voltar à região e acabar com a tal coceira. Ele foi...
   Após alguns exames preliminares, perceberam que era hora de agir. Mas como? Perceberam então que seria estratégico garantir os privilégios dos nobres da cidade, que assim se uniriam para perpetuar o governo principesco.
   Começaram então uma batalha para tomar as terras onde moravam vários camponeses, há muitos anos. A ideia era: expulsemos os pobres para longe, onde o barulho deles não nos atinja...

-  e aí, como continua esta história?  -

28 de agosto de 2011

Parabéns a você...

... nesta data querida, Sônia Gabriel!

   Como já te disse, desejo que continue nos ajudando a saber mais da terra pra viver mais perto do céu.
   Afinal, o céu começa na terra - como diria o monge budista das histórias que te mandei, e que compartilho aqui para quem mais chegar:

(deixo aqui a ligação pro sítio da Sônia, pois vale uma visitinha lá, meu povo!)

7 de janeiro de 2011

Conto curto: Manhã na selva

(porque às vezes as histórias nascem em prosa mesmo)

Manhã cedinho, mal o sol saía e eu cumpria minha sina. Abria caminho entre a selva fechada, cortando à esquerda e à direita com lâminas afiadas. O corpo se movia com dificuldade, tentando vencer o frio de um inverno que ainda se aproximava e já era sentido na pele. Eu sabia que os cortes tinham que ser precisos, para não ferir a mata além do estritamente necessário – e, mesmo assim, a contragosto. “Por quê ?”, pensava, às vezes. Mas não era momento de pensar: era fazer, e sem hesitação.
Não raro, sofria arranhões ou mesmo pequenos cortes, na ânsia de avançar através da mata densa. Será que teria fim aquilo ? Mas eu sabia que saberia quando a hora de parar chegasse. Não chegava.
Assim ia abrindo caminho, abrindo clareiras, clareando o dia, até que senti a presença de uma figura familiar.
Veio por trás, em aproximação tão direta quando sorrateira. De repente, laçando-me as pernas, disse:
– Papai, você fez a barba?! Muito bem, ficou lisinho!

(publicado originalmente na Revista Veredas, 2009)

29 de setembro de 2010