A história é tristemente real: uma moça começa um relacionamento com um sujeito e,
poucas semanas depois, é covardemente agredida pelo imbecil (perdão, não achei outra
palavra). O que fazer? Segundo a maioria das pessoas, o melhor é ir imediatamente
à delegacia e fazer um Boletim de Ocorrência. Porém, ainda antes de seguir o
conselho dos amigos, ela decide denunciar o agressor em rede social.
Perguntam-me:
por que ela faz isso? Sinceramente, não acho que a pergunta seja relevante
diante da gravidade do fato. A meu ver, a pergunta correta é bem outra: o que
leva um homem a cometer tamanho ato de covardia? De todo modo, vejo uma razão
bem simples para a publicação da moça. Imagino que ela tenha desejado deixar um
alerta, o mais claro e público possível, para fazer com que pessoas próximas de
um e/ou de outro fiquem cientes do potencial de agressão, do caráter violento
do sujeito que cometeu o gesto absurdo. Enfim, o que sei é que a moça posta uma
foto de seu próprio rosto – provando assim a agressão que acaba de sofrer – e junta
a isso um texto curto em que fornece o nome do agressor.
Para
nossa tristeza, surgem em cena os relativistas,
dizendo coisas como “será que ela não fez nada antes?” Outros argumentam que
não é possível ter certeza de que o acusado foi realmente o agressor. Ok, apure-se
tudo: de acordo. Porém, considero inadmissível que se parta para a inversão
dos fatos, com a culpabilização... da vítima. Absurdo! Há quem chegue a
comparar o caso a “mais um reality show”.
A pessoa agredida chega a ser chamada de exibicionista porque teve a coragem de
mostrar o que aconteceu. Que mundo é esse? Nessas horas, faço um baita esforço
para respeitar o direito de cada um falar (e escrever) o que quiser. No
entanto, sinto-me na obrigação de dizer (e gostaria que fosse em alto e bom
som) que precisamos parar de encarar violência real como cena de reality show!
É
necessário que as pessoas se conscientizem do seguinte: as agressões contra
mulheres nesse país vêm de muito longe e continuam até hoje. Curiosamente, estas
agressões reais e cotidianas não aparecem nos tais shows de (falsa) realidade. Aquilo
lá nos programas de TV não é reality,
meus caros: são “autênticas histórias falsas”, como diz um espanhol que conheci
anos atrás.
Dizem
alguns que “rede social não é pra isso”. Seria então para que? Só pra exibir
foto bonitinha de festa? Questionamento não pode? Denúncias são proibidas? Por
quem? De minha parte, todo respeito ao uso de toda e qualquer rede social como
local de manifestação de cidadania sim.
Triste
país o nosso. Uma mulher foi agredida e conseguiu fotografar e denunciar a
agressão antes mesmo de fazer o BO, ponto. Não vou condenar isso! Por sinal,
uma perguntinha básica: quantos Boletins de Ocorrência cada um de nós já leu
hoje? E quantas imagens já viu, no mesmo período? Pensem nisso.
Chamo
atenção para o fato de que não estamos aqui julgando fotos. A questão é que
precisamos debater e combater a violência. Também
precisamos combater o preconceito no julgamento que se faz de quem é vitimado
pela violência nesse país. São mulheres. São, também, negros, orientais, latinos,
nordestinos. Somos nós os agredidos, percebem?
Nenhum
de nós precisa ser parente ou amigo pessoal de uma pessoa agredida para sentir
o impulso da solidariedade, de querer se mostrar pronto a ajudar. A partir de
certas reações lidas hoje, sinto despertar em mim uma profunda verdade, mais
material do que qualquer foto. Aqui vai ela: nada pode desencantar mais o ser
humano do que a falta de solidariedade.
Isso
aqui é só minha opinião pessoal. Mas, em pleno século XXI, este começa a ser
um pais onde os agredidos não se calam. Não mais. E, como ninguém é uma ilha,
uma agressão a uma pessoa – qualquer pessoa – é uma agressão, também, a mim.
P.R.Barja