Também quero colocar minhas singelas opiniões, embora não tenha participado do encontro/debate organizado pelo Estivale e pelo SESC, já que estava acompanhando a apresentação do “Reis do Baralho”, com nossos amigos André Braga, Marcelo Moreira e Beto Quadros, no CAC Walmor Chagas, previamente marcado por coincidência no dia 07/10.
Na realidade, como milito na área cultural de São José dos Campos desde o primeiro Curso Livre de Teatro, realizado pela Fundação Cultural e que trouxe para a cidade os mais importantes profissionais de teatro da década de 80, e desde então, há 20 anos atuo, resisto e persisto no teatro joseense, penso que às vezes nos esquecemos que há 14 anos o PSDB assumiu a prefeitura e governa nossa cidade e isso faz a grande diferença no estabelecimento de políticas públicas de cultura.
Na esfera política federal, por exemplo, houve uma mudança de paradigmas na área cultural e os resultados são visíveis.
Muitos dos que hoje nos auxiliam nessa discussão, à época tinham 10 ou 12 anos de idade e podem, de repente, considerar que fazemos de conta que nada acontece.
Quero lembrar aos leitores desse blog, assinado pelo mestre Paulo Barja (que precisou sair de Santos para “descobrir” São José dos Campos), que é sempre prudente rever a história para podermos formular pensamentos e recuperarmos “pedaços” da recente história de nossa cidade, principalmente no que diz respeito às conquistas históricas que temos em nossas mãos, como é o caso da Fundação Cultural Cassiano Ricardo.
A FCCR foi criada em 1986 como uma das mais “progressistas e democráticas” fundações do Brasil e que atuava por meio de comissões setoriais que elegiam seus coordenadores para compor o Conselho Deliberativo da instituição, responsável pela discussão e formulação de políticas públicas na área cultural do município.
Um grupo de abnegados artistas, intelectuais, políticos e interessados da nossa sociedade, não mediram esforços para que a cidade pudesse ter uma instituição de cultura que respeitasse e valorizasse a produção local, sem perder o foco das ações que pudessem contribuir no fortalecimento e crescimento da cultura em nossa cidade, contribuindo assim, de forma efetiva, para o desenvolvimento social de todos nós.
Durante quatro anos esses artistas, principalmente, lutaram para concretizar uma idéia, que só passou a existir depois de muitas reuniões e manifestações públicas em praças e escolas de São José. Nasceu então em 1986 a Fundação Cultural.
A história é longa, mas é sempre bom relembrar, revigorar. Criada pelo então prefeito Hélio Augusto de Souza para progredir na política pública, foi erroneamente interpretada por alguns políticos e, parafraseando o jornalista Paulo Henrique Amorim, pelo “PIG” (Partido da Imprensa Golpista)! Quem não se lembra do título em um famoso jornal da cidade: “Sexo, drogas e corrupção na Fundação Cultural”.
Mas, voltemos à história. Com a morte do Hélio, assume então o presidente da Câmara, Sr. Antonio José Mendes Faria, que, na época, não se conforma e questiona constantemente porque a FCCR não poderia trazer “Chitãozinho e Xororó” para cantar na cidade? E esse pensamento ainda ocorre até hoje e foi aí, na minha visão, que começaram os equívocos.
E muitos erros e enganos foram cometidos ao longo desses 24 anos de existência e talvez, o maior deles, foi acreditarmos que a formula já estava pronta e que, a partir dali, não se fizesse mais necessária a nossa organização. Que a nossa organização era a própria Fundação Cultural.
Quando a Comissão Municipal de Teatro criou em 1990 o Grupo Teatro da Cidade (que deu origem em 1993 à Cia Teatro da Cidade), muitos foram os alertas sobre o primeiro erro dentro da instituição. Quem acompanhou e vivenciou esse período sabe que, apesar dos ótimos resultados obtidos na formação individual de cada integrante e do fantástico trabalho de formação de público, a existência de um grupo estável de teatro na entidade, significava negligenciar a existência dos demais grupos de teatro naquela oportunidade. E foi em decorrência a isso que temos hoje na cidade, importantes grupos como o Velhus Novatus, Cia Sem Máscaras, dentre tantos exemplos.
Mas porque é importante rever nossa recente história na área cultural? Para não cometermos outros erros. Para não esquecermos os protagonistas dessa história. Para não deixar de valorizar e respeitar os recentes protagonistas que chegam e nos chamam para um novo ato do mesmo espetáculo e não como coadjuvantes de um novo trabalho, o que fragiliza nossas ações.
Precisamos nos lembrar que em algumas oportunidades convocamos a cidade e o movimento cultural para dois encontros que chamamos de “Cultura em Questão” e que, nos dois encontros, foram promovidos debates com aqueles que à época pretendiam governar São José dos Campos. Nesses encontros, inclusive, já foram apontadas as futuras ações do PIG e de alguns políticos “progressistas”, mas nós ficamos pacientemente, quietamente...aguardamos...aguardamos...aguardamos.
Existem compromissos assumidos e um deles, talvez o mais importante para nós, produtores e criadores culturais, seria o Fundo Municipal de Cultura. E mais uma vez, como tantas outras, esses compromissos foram deixados de lado e nós, pacientemente, quietamente, aguardamos... aguardamos... aguardamos.
Saímos novamente à luta. Fizemos reuniões, tentamos nos organizar, levantamos discussões, mobilizamos vereadores e elaboramos um modelo para o “nosso” Fundo Municipal de Cultura. E mais uma vez o poder nos olhou como meros coadjuvantes da cidade e nosso modelo foi para as gavetas do mesmo Prefeito que em 2004, publicamente, em um debate com a nossa participação ativa e interessada em melhorar a sociedade joseense, assumiu o compromisso de defender e criar o Fundo Municipal de Cultura de São José dos Campos.
O ponto principal, como reflete bem a Jacqueline, é que não existe eco entre a sociedade civil e o governo local. Esse ponto está, cada vez mais, nos distanciando de nós mesmos e, por conseqüência, está enfraquecendo nossa organização, nossa produção, nossa contribuição com o que poderíamos chamar de política cultural.
Em tempo: a nossa organização é tão fragilizada que, quando podemos expor nossa opinião, somos chamados de “curralzinho”!
Quando o Carlos Rosa diz “Somos mais importantes que a Fundação Cultural. Ela deve existir para a cidade toda e não nós para ela”, ele está absolutamente certo e coerente. Nós é que podemos ser os protagonistas da história cultural da cidade. A Fundação Cultural deve ser vista como uma possibilidade a mais de nosso trabalho e não a única fonte. Precisamos sim nos organizar para acabar com essa “grande fornecedora de tetas para os vereadores da nossa cidade” e demais políticos dessa cidade.
Para finalizar, vamos refletir com Bertolt Brecht:
“Privatizaram sua vida, seu trabalho, sua hora de amar e seu direito de pensar.
É da empresa privada o seu passo em frente, seu pão e seu salário.
E agora, não contentes, querem privatizar o conhecimento,
a sabedoria, o pensamento, que só à humanidade pertence”
Que o poder queira fazer isso com a classe artística e cultural eu até entendo - não aceito, mas entendo. Mas, que a própria classe artística e cultural queira fazer isso com a gente, eu não consigo entender e nem aceitar.
Portanto, vamos discutir sim a questão cultural na cidade, mas com respeito e com muita propriedade.
Andréia Barros - Atriz, jornalista e mestre em Artes pela Unicamp.